A Lei dos Mercados Digitais, conhecida pela sigla DMA (Digital Markets Act), é uma legislação criada pela União Europeia com o objetivo de promover um ambiente digital mais justo, competitivo e transparente.
Aprovada oficialmente em 2022, a DMA entrou em vigor em maio de 2023, mas passou a ser plenamente aplicada a partir de março de 2024, após um período de adaptação.
O foco principal da lei está nos chamados “gatekeepers” — grandes empresas de tecnologia que controlam plataformas essenciais para milhões de usuários e negócios.
Segundo a Comissão Europeia, esses gatekeepers têm poder suficiente para ditar regras de mercado, prejudicar concorrentes e limitar a inovação.
A DMA, portanto, busca limitar práticas consideradas abusivas e garantir que consumidores e empresas tenham mais opções e maior liberdade no ambiente digital.
Quem são os gatekeepers?
Para ser classificada como gatekeeper pela União Europeia, uma empresa precisa cumprir critérios como:
- Ter receita anual superior a € 7,5 bilhões na União Europeia ou capitalização de mercado superior a € 75 bilhões.
- Oferecer serviços com mais de 45 milhões de usuários finais mensais e mais de 10 mil usuários empresariais ativos anuais na UE.
- Exercer um papel de intermediação essencial entre empresas e consumidores.
Com esses critérios, diversas empresas do setor de tecnologia foram designadas como gatekeepers, incluindo Google, Amazon, Meta, Microsoft e, claro, a Apple.
Como a DMA afeta a Apple?
A Apple, como uma das principais big techs globais, está entre as empresas mais impactadas pela DMA.
A legislação força a companhia a realizar mudanças significativas na forma como opera seu ecossistema na União Europeia, especialmente em relação à App Store, ao iOS e aos seus sistemas de pagamento.
Veja as principais obrigações impostas à Apple pela DMA:
1. Abertura da App Store para lojas alternativas
Uma das mudanças mais significativas é que a Apple agora é obrigada a permitir a instalação de lojas de aplicativos de terceiros nos dispositivos iOS dentro da União Europeia.
Antes da DMA, os iPhones e iPads só podiam instalar apps por meio da App Store, com todas as transações sujeitas à comissão da Apple, que varia entre 15% e 30%.
Com a DMA, a Apple deve permitir que os usuários instalem aplicativos fora da App Store, através do chamado sideloading ou lojas alternativas.
Isso abre espaço para concorrência direta, reduz a dependência da loja oficial da Apple e pode afetar uma de suas principais fontes de receita.

2. Liberação de sistemas de pagamento alternativos
Outra obrigação imposta à Apple é a de permitir que desenvolvedores utilizem sistemas de pagamento próprios ou de terceiros dentro dos seus aplicativos.
Antes, todos os pagamentos em apps distribuídos pela App Store precisavam passar pelo sistema da Apple, novamente sujeito a taxas.
Agora, na União Europeia, os desenvolvedores podem integrar opções de pagamento alternativas, o que pode reduzir custos para as empresas e oferecer mais opções aos consumidores.
3. Maior interoperabilidade com outros serviços
A DMA também exige que as plataformas garantam maior interoperabilidade com serviços de terceiros.
No caso da Apple, isso significa, por exemplo, facilitar a comunicação entre o iMessage e outros sistemas de mensagens, como o WhatsApp ou o Telegram, quando tecnicamente viável.
Além disso, há exigências de interoperabilidade relacionadas a assistentes virtuais, navegadores e serviços de busca, forçando a Apple a abrir espaço para concorrentes do Safari ou da Siri.
4. Proibição de práticas consideradas abusivas
A lei também proíbe uma série de práticas que, segundo a Comissão Europeia, distorcem a concorrência. No caso da Apple, algumas delas incluem:
- Não permitir que desenvolvedores informem os usuários sobre alternativas de compra fora da App Store.
- Prejudicar ou limitar a funcionalidade de aplicativos concorrentes aos próprios serviços da Apple.
- Dar tratamento privilegiado aos seus próprios serviços em relação a concorrentes, por exemplo, priorizando o Apple Music sobre o Spotify.
As respostas da Apple à DMA
A Apple respondeu à DMA implementando algumas mudanças específicas para o mercado europeu. Por exemplo, criou novos mecanismos para permitir a instalação de apps de terceiros e ajustou suas regras de pagamento.
No entanto, a empresa também adicionou novas taxas e processos de certificação, argumentando que são necessários para garantir a segurança e a privacidade dos usuários.
Essas medidas foram criticadas pela Comissão Europeia, que avalia que a Apple estaria tentando contornar o espírito da lei ao criar barreiras adicionais ao sideloading e aos sistemas de pagamento alternativos.
Em abril, a Comissão multou a Apple em € 500 milhões por considerar que as medidas da empresa ainda não estavam plenamente em conformidade com a DMA, e estabeleceu um prazo para ajustes completos, sob pena de multas diárias.
O impacto da DMA para consumidores e desenvolvedores
Para os consumidores, a aplicação da DMA promete ampliar as opções de escolha e reduzir custos.
Usuários de iPhone, por exemplo, podem passar a instalar aplicativos de fontes alternativas, potencialmente com preços mais competitivos e sem a obrigatoriedade de usar apenas os sistemas da Apple.
Para os desenvolvedores, a DMA significa uma oportunidade de escapar das altas taxas da App Store e ter mais controle sobre suas próprias plataformas e pagamentos.
No entanto, também existem desafios, como questões de segurança e privacidade, tradicionalmente apontadas pela Apple como justificativa para manter seu ecossistema fechado.
Um divisor de águas para a Apple na Europa
A Lei dos Mercados Digitais representa uma das maiores intervenções regulatórias já feitas contra as big techs, e a Apple está no centro desse movimento.
A empresa terá que equilibrar sua busca por segurança e controle com as novas obrigações legais de abertura e interoperabilidade.
Ainda é cedo para medir todos os impactos da DMA sobre o modelo de negócios da Apple, mas é certo que o mercado europeu já não será mais o mesmo.
A depender do sucesso dessas medidas na União Europeia, outras regiões do mundo podem seguir o mesmo caminho, promovendo uma transformação global no setor de tecnologia.